quarta-feira, dezembro 17, 2008

A Filosofia da Couve

Quantos de nós, nascidos e criados nos subúrbios lisboetas e deambulando por esse país fora, em grandes e pequenas cidades, vilas e lugarejos, nunca parámos 10 minutos a olhar para as casas que compõem esse aglomerados populacionais? Surgem de todos os estilos e feitios, desde o bloco paralelepipédico com janelas e persianas brancas à grande casa de três andares construída pelo imigrante canadiano e que de volta à terra, ao Casal Domingos João, mostra aos seus conterrâneos o seu sucesso na construção civil estrangeira. Mas não estou aqui hoje para debater arquitectura… já alguém o fez. Até as casas de imigrantes dos anos 70, as ditas “casas-de-banho” viradas do avesso, devido aos seus excelsos azulejos decorativos, têm um lugar nos movimentos arquitectónicos contemporâneos. O que vos peço que memorizem da próxima vez que viajarem por esse país, desde o Algueirão a Braga, são os pequenos jardins que, tradicionalmente se encontram ao lado, ou mais comummente, à frente dessas mesmas casas. A maioria com poucos metros quadrados, apresentam indiscutivelmente alguns canteiros separados por aquele caminho forrado a desperdício de mármore, provavelmente oriundo de uma qualquer pedreira no termo de Estremoz. Esses mesmos canteiros preenchem os desejos de jardinagem de qualquer dona de casa nos quais o ranking de espécies é ocupado necessária, quando não exclusivamente, por uma roseira cor-de-rosa ou branca, uma cameleira vermelha e, em casos de absoluta excentricidade alguns gladíolos.

Peço-vos no entanto que desviem a vossa atenção alguns centímetros para o outro canteiro, menos perceptível ao olho não treinado. A par do magnífico jardim aparece indiscutivelmente a pseudo-horta onde variam as espécies conforme os meses do ano, alternando entre os cheirinhos, tomates, pimentos e a eterna malagueta. Todavia, tal plantação não sobreviveria sem o talo desgastado da couve tronchuda, com tenrinhas folhas a brotarem do topo do seu metro de altura onde, ao longo do ano foram sendo retiradas as primeiras, qual palmeira em Sunset Boulevard. É uma verdade incontestável e facilmente comprovada, basta olharem em redor. A couve tronchuda é uma presença assídua de qualquer jardim que se preze em Portugal, tão valiosa e importante como a roseira. Mas qual a razão para que tal espécie se tenha tornado um dos mais belos emblemas decorativos do verde que embelezam as casas portuguesas? De certeza que várias teorias existem em torno desta problemática… a mim só me ocorre relacionar a sua presença directamente com o pessimismo do povo português. Não é uma novidade que somos o povo europeu que mais desconfia dos vizinhos e que menos acredita nas pessoas que nos rodeiam. O amanhã é sempre uma incógnita e tudo o que os outros fazem é sempre melhor que o realizado pelas gentes deste país. Quem não acreditar em mim leia o livro do Fernando Gil. Ainda que com algumas incongruências, deram o Prémio Pessoa ao senhor… os 50 mil euros à parte, é porque deve desenvolver umas ideias com piada. Desta forma, conseguimos claramente penetrar na mente de quem ali plantou aquela beleza ornamental, criando um mirabolante arranjo cénico: “Pode não haver mais nada, mas há sempre umas folhinhas para um caldinho”

O presente texto é apenas a introdução da teoria filosófica que desenvolvemos. Não quisemos sobrecarregar os leitores com o desenvolvimento de todas as receitas de sopa e migas que se podem fazer com recurso às folhas de uma couve tronchuda. Igualmente, os relatos orais de quem as possui nos seus canteiros foram deixados de parte bem como as histórias de como as mães e avós daquelas pessoas mataram a fome à família com recurso às couves plantadas no quintal. Esta herança vegetalista encontra-se documentada e poderá ir à estampa em breve, retratando o quotidiano de diversas casas e a forma como a couve influencia os comportamentos sociais e culturais de milhares de pessoas neste país.


A pedido da minha amiga Diana, a criadora do Fumos e Chás, que ainda acredita no absurdo dos meus raciocínios.
by Tânia Casimiro


Ficará para mais tarde a minha dissertação a partir desta mote, qual absurdo pensamento qual quê, este, encaixa nos meus absurdos pensamentos que vou atirando para este mundo virtual. Roça a genialidade e a perspicácia de quem passa a vida a olhar para pormenores que alteram pensamentos e correntes.
by Diana

2 comentários:

José Borges disse...

yes darling? you may procede!

Mariana disse...

Aqui está o estudo que faltava! Uma problemática tão fascinante quanto vasta e quase (quase...) tão parva quanto a teoria da conspiração relacionando a revolução industrial com uma imensa cabala para mudar o clima da Europa de modo a poderem plantar-se drogas diversas e fazer concorrência á América do Sul. É uma ideia a desenvolver...